1975: Entrevista com Russell Harty, via satélite, a partir de Los Angeles
Russell Harty: David Bowie vai anunciar uma coisa. Vamos passar ao vivo, via satélite, à bonita baixa de Burbank em Los Angeles. David Bowie, estás aí?
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Da última vez em que nos encontrámos estavas sentado neste estúdio com um brinco muito elegante do lado esquerdo ou direito, já não me recordo. Lembras-te disso?
David Bowie: Como vais, Russell? Prazer em ver-te.
Russell Harty: (risos) Obrigado, David. O prazer é meu. Estás com bom aspeto. De que cor é o teu cabelo?
David Bowie: Que parte?
Russell Harty: A parte central no cimo, por cima do teu nariz.
David Bowie: Bom, é… De que cor achas?
Russell Harty: Bom, parece algo saído do fim de Cães de Palha (Straw Dogs, filme de 1971).
David Bowie: Saído do fim de Cães de Palha…
Russell Harty: Ora, tens algo para nos anunciar, David, não tens? Estás a alterar os teus planos para o futuro e tens algo na manga para 1976.
David Bowie: Sim. Estou em tournée mas vou regressar a Inglaterra em maio para tocar ao vivo e para te ver e para ver a Inglaterra e para ser inglês.
Russell Harty: De novo.
David Bowie: Bom, como sempre. Só que inglês em Inglaterra.
Russell Harty: Sabes, não… O teu sotaque, a tua voz, a tua forma de falar não mudaram. Estiveste fora dois anos.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Quer dizer que estiveste fechado em algum lugar?
David Bowie: Sim, não falei com ninguém. (risos)
Russell Harty: As pessoas falam contigo?
David Bowie: Ouvi dizer que sim, sim.
Russell Harty: (risos) Bom, quando voltares a Inglaterra para cantar…
David Bowie: (aponta para o auscultador) Sempre tive esta coisa no ouvido, portanto é difícil ouvi-las.
Russell Harty: Mas as pessoas podiam gritar para o teu outro ouvido, não era?
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Certo. Então, quando voltares a Inglaterra não vais trazer a tua cena do glam e dos brilhantes do Ziggy Stardust, vais?
David Bowie: Hu-hu.
Russel Harty: Vais voltar assim?
David Bowie: Ainda não sei, não, hmm, pensei sequer nisso.
Russell Harty: Portanto, vais…?
David Bowie: Acho que provavelmente… Hmm? Vou ser muito mais espontâneo.
Russell Harty: Não planeaste o teu guarda-roupa, não planeaste uma figura, não planeaste uma imagem, o que quer que isso signifique?
David Bowie: Acho que talvez a imagem que eu venha a adotar seja eu, estou a inventar-me neste momento.
Russell Harty: Queres dizer a reinventar-te?
David Bowie: Sim. Autoinventado.
Russell Harty: (risos) Coisas do peito para cima.
David Bowie: Sim. É muito desconfortável.
Russell Harty: Ai, sim? Então, não tens nenhuma ideia simples sobre o que vais vestir, quer dizer, vais usar um casaquinho, um fato apertado, ou vai ser extravagan…
David Bowie: Sei quais as canções que vou cantar, que é o mais importante…
Russell Harty: Vais…
David Bowie: … mas mais nada, não.
Russell Harty: Há temas novos?
David Bowie: Sei o tipo de músicos que vou levar. Não tenho nenhuma ideia aproximada de quanto tempo vou ficar no palco, mas isso é que é importante.
Russell Harty: O que é que te faz voltar? Estás com falta de dinheiro ou sentes a falta de um público ao vivo?
David Bowie: Falta de Inglaterra, acima de tudo.
Russell Harty: Como? Ou seja, tens a noção de que a Inglaterra que deixaste há dois anos não é a Inglaterra para a qual vais voltar?
David Bowie: Sim, esta quinta-feira não tem nada a ver com a quinta-feira passada mas é igualmente importante. Sentir-lhe-ia a falta se não viesse depois de quarta.
Russell Harty: Sabes que a cena pop, o mundo pop teve algumas mudanças desde que partiste?
David Bowie: Não. Não…
Russell Harty: Ouviste falar nos Bay City Rollers?
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Bom, sabes que estão a captar um público jovem que reage com histeria de massas e que se faz notar de muitas maneiras. Pergunto-me que tipo de público vais encontrar no teu regresso…
David Bowie: Não sei. O que achas?
Russell Harty: Não sei. Acho que, de certa forma, vais ter que criar uma nova onda para ti.
David Bowie: Não.
(silêncio prolongado)
Russell Harty: O que…
Davod Bowie: Não tenho capacidade para isso. Limitar-me-ei a voltar e a tocar as minhas canções. (sorri)
Russell Harty: Bom, para alguém que… Parece que disseste, David, que para alguém que não é um músico muito bom, geraste muita confusão, muito ruído.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Se não te consideras um bom músico, o que procuras?
(Bowie faz um brinde)
Russel Harty: Que é que estás a beber ?
David Bowie: Tree Top Beverages! (uma marca de bebidas que inclui, basicamente, sumos de frutas)
Russell Harty: É bom? Vais-nos cuspir um pouco via satélite?
David Bowie: Não.
Russell Harty: Hmm, para alguém que afirma não crescer enquanto músico, porque é que vais voltar e subir aos palcos? Será que, na verdade, és um músico melhor do que aquilo que admites?
David Bowie: Não sou capaz de estabelecer a ligação entre essas duas coisas. Se não sou um músico assim tão bom, porque é que regresso…
Russell Harty: Sim.
David Bowie: Bom, regressar não tem nada a ver com ser um músico.
Russell Harty: Mas achas que és um músico melhor depois destes dois anos de…
David Bowie: Não digo no palco! Sou um bom artista e sou um bom cantor. Isso não tem nada a ver com ser um músico. Tem?
Russell Harty: Bom, não sei, quer dizer, tens que mo dizer, ou seja, uma afirmação tão profunda, não acho que possa…
David Bowie: Não tem que ser tão a preto e branco, ou tem? Vais contribuir com algo?
Russell Harty: Qualquer coisa. Estou a usar um satélite caro.
David Bowie: Ok.
Russell Harty: Então, também disseste que precisavas de espantar as pessoas, não queres regressar como um tipo normal a fazer um espetáculo normal no Odeon Hammersmith. Neste instante, tens alguma ideia, além de que vais simplesmente tocar ao vivo, de como é que nos vais espantar ou a ideia só te surge na noite anterior?
David Bowie: Provavelmente, vou ser mais rápido do que já fui… Essa vai ser a minha… não, não tenho mesmo nenhuma ideia quanto a isso. O impacto do espetáculo é que tem que causar espanto, não a sua aparência, entendes? O visual não passa de um visual, é um tipo de coisa superficial mas o conteúdo tem que ser marcante, ou seja, podes gastar triliões de dólares ou triliões de libras em adereços mas se o espetáculo não tiver substância não vai causar impacto.
Russell Harty: Que te lembres, qual foi a melhor coisa que já fizeste num palco, que ainda está viva em ti quando analisas tudo?
David Bowie: A melhor, é muito difícil. Uma das coisas mais estimulantes que fiz foi trabalhar com o Lindsay, o Lindsay Kemp, em… quando é que terá sido? Não me lembro da data mas foi há anos… Foi um tipo de espetáculo com diferentes media combinados. Foi muito bom.
Russell Harty: Não tinha que ser um enorme estímulo super brilhante, quer dizer, foi uma pequena… só é importante para ti.
David Bowie: Bem, sim.
Russell Harty: Acabaste de filmar a película O Homem que Veio do Espaço (The Man who Came to Earth).
David Bowie: Fell to Earth.
Russell Harty: Fell to Earth, peço desculpa. Não se trata de um filme fácil de explicar a quem o não tenha visto e ainda não está concluído, pois não?
David Bowie: A parte visual está concluída, mas falta o som. Tenho que gravar o som, já escrevemos grande parte… Digo-te… O que te posso dizer é que se trata, sobretudo, de uma história de amor. É muito, muito triste. Muito romântico. Deu-me um nó na garganta quando o vi e tem sido espetacular trabalhar nele. Sim.
Russell Harty: Foi-te fácil assimilares a disciplina das filmagens que é, como bem sabemos, dura?
David Bowie: Oh! Muito fácil. Sou uma pessoa muito disciplinada, sabes. Para mim, foi muito estimulante trabalhar com outras pessoas igualmente disciplinadas.
Russell Harty: Estás a ser mesmo exato e honesto quando afirmas que és disciplinado?
David Bowie: Com certeza.
Russell Harty: Impões-te uma disciplina quando escreves, não acordas só quando… Muita gente na tua posição tem uma espécie de…
David Bowie: Não significa que tenha que tomar o pequeno-almoço às oito da manhã e sair de casa às oito e um quarto. A disciplina é… se pensares em algo, decides se vale a pena avançar e, caso valha a pena, levas as coisas a direito até à sua conclusão lógica e dás o teu melhor. Essa é que é a disciplina. Certo? Mesmo se houver algumas áreas que não te agradem, tens que levar as coisas até ao fim, trabalhá-las e é isso que faço.
Russell Harty: E, mais importante do que isso, podem não agradar aos outros. É frequente haver coisas que, enquanto grande estrela, decides fazer, que deixam as pessoas num estado de antecipação.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Porque podes não ser a pessoa certa na altura certa ou podes estar sem inspiração e necessitas de alguém que ta renove.
David Bowie: É porque gosto bastante de olhar para mim mesmo e de olhar para a atmosfera que me rodeia em cada momento através dos olhos de alguém que não tem qualquer envolvimento com nenhum campo das artes. Daí resulta uma espécie de manifestação eclética. Continuo a ser fã de tudo… Fã de discos, fã de bandas de rock, teu fã…
Russell Harty: Bom, obrig…
David Bowie: Sou teu fã.
Russell Harty: Bom, voltemos às manifestações ecléticas. O filme, agora… Vamos ver um pouco do filme O Homem que Veio do Espaço (The Man Who Fell to Earth) e, depois, falaremos acerca dele. Aqui estás, caíste na Terra e, quando te estás a adaptar à atmosfera, tornas-te o alvo das atenções de uma jovem no teu quarto de hotel.
David Bowie: Ouve, antes de passares isso, tenho que explicar que a assunção de que sou um alienígena do espaço cósmico não é necessariamente verdadeira.
Russell Harty: Muito bem. Ótimo.
Passa um excerto de O Homem que Veio do Espaço.
Russell Harty: David, o filme não está concluído, ainda não está editado e pronto, mas já perpassam áreas de mistério, grande parte dele é misteriosa, isso é deliberado?
David Bowie: Sim, trata-se de um mistério. Como muitas coisas costumam ser.
Russell Harty: Será que dizer que o final não é muito feliz é revelar demasiado?
David Bowie: Realmente é. E não, o final não é feliz. Eu não estou lá para a Candy Clark. Não achas a Candy Clark boa atriz?
Russell Harty: Mesmo boa.
David Bowie: Excelente.
Russell Harty: Ele já tinha trabalhado noutros filmes?
David Bowie: O último em que participou foi o Loucuras de verão (American Graffiti, filme de George Lucas, de 1973).
Russell Harty: Mas até que ponto também contribuíste para o filme? Quero dizer, o Nicholas Roeg parava e dizia: “Para onde vamos? Como é que nos movimentamos? Que é que achas?”. Tiveste um papel ativo na realização?
David Bowie: Não, a minha contribuição foi a minha representação. E a cenografia em geral. Tenho o maior respeito pelo trabalho de Nicholas Roeg. Não. Não teria feito o filme se assim não fosse.
Russell Harty: Ainda pensas nos extraterrestres, ainda tens a perceção de forças, que não satélites, que se movem em torno do globo, deste planeta, em torno de ti, David Bowie?
David Bowie: Claro que sim!
Russell Harty: Que tipo de manifestações complexas recebes disso?
David Bowie: Hmm… Uma montanha ou uma árvore são manifestações de forças com as quais não sabemos lidar.
Russell Harty: Também vais à igreja?
David Bowie: Não.
Russell Harty: Rezas?
David Bowie: Sim, claro.
Russel Harty: Mas rezas às montanhas e às árvores, a essas manifestações físicas, ou a algum tipo de espírito?
David Bowie: Não acho que queira entrar por aí numa entrevista de vinte minutos. Quando voltar a Inglaterra poderei dizer-te o que penso, sim. Em profundidade.
Russell Harty: É sensato. O filme fez nascer em ti a vontade de participares em mais?
David Bowie: Não. Muito dificilmente. O que fez foi fazer crescer em mim a vontade de voltar às pequenas coisas que costumava fazer há muitos anos. Como pintar, escrever, passar tempo livre a sós e com a minha família, afastar-me das cidades…
Russell Harty: E relaxar.
David Bowie: Não, muito mais do que relaxar, sentir-me à vontade.
Russell Harty: Espero contribuir para que te sintas à vontade um ou dois segundos, já que vamos fazer uma pausa para anúncios e regressaremos em um ou dois minutos…
David Bowie: Ok.
Pausa para anúncios
Russell Harty: Uma vez mais, bem vindos. David Bowie, de regresso, sentado numa estranha praia em Burbank, Los Angeles. Falamos sobre filmes e a forma como se constroem. Uma das pessoas com quem imagino que tivesses gostados de trabalhar seria Pier Pasolini…
David Bowie: Teria?
Russell Harty: Li noutras entrevistas tuas que achavas o trabalho dele estimulante.
David Bowie: Neste momento, só consigo pensar em trabalhar com o Nicholas Roeg. Nunca fiz um filme. Não sei se voltarei a fazer um filme. E, para mim, não é uma questão de entrar no mundo do cinema… Este trabalho foi uma coisa tangível e tátil. E uma experiência de que precisava. Não tenho a certeza de gostar da ideia de me tornar ator. Em si.
Russell Harty: Mas estás numa posição privilegiada, não estás, David? Não tens que decidir nada assim, pois não?
David Bowie: Todos os dias tenho que tomar tantas decisões como qualquer outra pessoa. Sim, tenho que tomar decisões. Considero-me bastante responsável.
Russel Harty: Não estava a por em causa o teu sentido de responsabilidade, mas digo que estás mais bem equipado do que a maioria das pessoas para tomares esse tipo de decisões relativamente ao teu futuro…
David Bowie: Não foi nada disso que disseste! (risos)
Russell Harty: Se é…
David Bowie: Ah-ah!
Russell Harty: Não é o que eu disse, mas é o que pretendia dizer.
David Bowie: Sim, sou capaz de decisões determinadas.
Russell Harty: Quero dizer, tens a fama, tens uma certa fortuna, tens atores que te podem dar bons conselhos, pelo que não és como um rapaz ou uma rapariga numa cave em Notting Hill, lutando para conseguir uma posição favorável… Alguém que quer ser ator, estrela do cinema, entrar em cena.
David Bowie: Mas já fui.
Russell Harty: Consegues recordar esses tempos?
David Bowie: Sim, perfeitamente. Faço o mesmo que fazia nesses tempos.
Russell Harty: Mas talvez seja isso que te torna melhor do que serias se assim não fosse. Porque te lembras desse tipo de disciplina e dos tempos difíceis. Mas agora estás numa posição em que podes desfrutar.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Estás a gostar do dia de hoje? Estás a gostar desta conversa?
David Bowie: Acho-a maravilhosa!
Russell Harty: (risos)
David Bowie: A sério que sim. Bastante. Só é pena teres tantas certezas. Porque atualmente tenho muito cuidado ao lançar-me nesse tipo de…
Rissell Harty: Já reparei!
David Bowie: … discuss… apenas porque gosto muito de conversar e parece-me uma perda de tempo disparar à toa. Mas é ótimo! Acho que vamos num ritmo muito razoável.
Russell Harty: Ainda bem. Vou-te dizer do que gosto, embora não devesse: ter esta conversa a uma distância de milhares de quilómetros…
David Bowie: É estranho, não é?
Russell Harty: Muito estranho. Mas não me importo que não me respondas a certas perguntas. Quero dizer, lancei-te cerca de cinco perguntas difíceis e fico satisfeito por não responderes porque tens toda a razão.
David Bowie: É a falta de tempo, a falta de tempo…
Russell Harty: Certo. Sabes, desde que estiveste neste programa, a tua senhora foi minha convidada e gerou alguma turbulência…
David Bowie: Esteve muito bem. Eu vi. Mandaram-me uma cópia. Ela é adorável, é muito boa.
Russell Harty: E fala muito.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: E penso… ela já decidiu o que pretende? Ela está cá, está sozinha?
David Bowie: Está na Suíça à procura de uma casa.
Russell Harty: Para os dois?
David Bowie: Sim. Vamos lá ficar enquanto ando em tour pela Europa.
Russell Harty: Se ela vir este programa…
David Bowie: Somos três. Nós os três.
Russell Harty: Zowie, Zowie… (alterando a pronunciação do nome) Como é que se diz?
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Está com que idade?
David Bowie: Zowie.
Russell Harty: Está com que idade?
David Bowie: Bom, quatro anos e meio, cinco em maio.
Russell Harty: E vai ao infantário ou onde vai?
David Bowie: Sim. Sim.
Russell Harty: Obrigam-no?
David Bowie: Sim. (sorriso) É muito inteligente.
Russell Harty: Ele sabe…
David Bowie: É uma criança. Quero dizer, é inteligente como qualquer criança deve ser na idade dele. Não é nenhum prodígio, graças a Deus.
Russell Harty: Ainda.
David Bowie: Ainda.
Russell Harty: Dá-lhe tempo, David, dá-lhe tempo… Sabes, desde que partiste, ou melhor, recentemente, os jornais têm andado a aborrecer a tua mãe… Dizem que de vez em quando se sente triste e que sente uma certa angústia e que não contacta muito contigo. É conversa ou é mesmo assim?
David Bowie: Na verdade, isso só me diz respeito a mim.
Russell Harty: E é assim que vai continuar, sim?
David Bowie: Sim. Estou a ver que tens um forte sexto sentido para boatos (sense of rumour em vez de sense of humour), Russell!
Russell Harty: (risos) Um sexto sentido altamente desenvolvido! Bom, David, estamos a aproximar-nos do fim da nossa conversa forçada.
David Bowie: (irónico) Oh, que pena!
Russell Harty: Acho que podemos terminar com um pouco de música. Porque suponho que onde estás, no bonito centro de Burbank, terás alguma música contigo. Quero dizer, não te vais levantar e atuar, mas…
David Bowie: Não! A verdade é que gostaria de o fazer, só que o tempo não o permite, mas vou ver, sei o que é, estou muito bêbedo nessas filmagens! Estava muito nervoso e bebi um par de copos, algo que nunca faço, não deveria tê-lo feito. Está muito bem, é muito divertido.
Russell Harty: Para o programa?
David Bowie: Com certeza!
Russell Harty: Bom, vamos vê-lo. A canção chama-se The Shape of Things to Come…
David Bowie: Isso não é David Bowie.
Russell Harty: Não, não, não, claro que não. Vamos ter uma antevisão de The Shape of Things to Come. A canção chama-se Golden Tears. Mr. David Bowie! Estaremos de volta depois de vermos alguns…
David Bowie: Enganaste-te no nome, é Years.
Russell Harty: Years? Porque é que não a apresentas?
David Bowie: (enquanto Golden Years começa a passar) Este é David Bowie a cantar Golden Years do seu próximo álbum, Station to Station!
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Da última vez em que nos encontrámos estavas sentado neste estúdio com um brinco muito elegante do lado esquerdo ou direito, já não me recordo. Lembras-te disso?
David Bowie: Como vais, Russell? Prazer em ver-te.
Russell Harty: (risos) Obrigado, David. O prazer é meu. Estás com bom aspeto. De que cor é o teu cabelo?
David Bowie: Que parte?
Russell Harty: A parte central no cimo, por cima do teu nariz.
David Bowie: Bom, é… De que cor achas?
Russell Harty: Bom, parece algo saído do fim de Cães de Palha (Straw Dogs, filme de 1971).
David Bowie: Saído do fim de Cães de Palha…
Russell Harty: Ora, tens algo para nos anunciar, David, não tens? Estás a alterar os teus planos para o futuro e tens algo na manga para 1976.
David Bowie: Sim. Estou em tournée mas vou regressar a Inglaterra em maio para tocar ao vivo e para te ver e para ver a Inglaterra e para ser inglês.
Russell Harty: De novo.
David Bowie: Bom, como sempre. Só que inglês em Inglaterra.
Russell Harty: Sabes, não… O teu sotaque, a tua voz, a tua forma de falar não mudaram. Estiveste fora dois anos.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Quer dizer que estiveste fechado em algum lugar?
David Bowie: Sim, não falei com ninguém. (risos)
Russell Harty: As pessoas falam contigo?
David Bowie: Ouvi dizer que sim, sim.
Russell Harty: (risos) Bom, quando voltares a Inglaterra para cantar…
David Bowie: (aponta para o auscultador) Sempre tive esta coisa no ouvido, portanto é difícil ouvi-las.
Russell Harty: Mas as pessoas podiam gritar para o teu outro ouvido, não era?
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Certo. Então, quando voltares a Inglaterra não vais trazer a tua cena do glam e dos brilhantes do Ziggy Stardust, vais?
David Bowie: Hu-hu.
Russel Harty: Vais voltar assim?
David Bowie: Ainda não sei, não, hmm, pensei sequer nisso.
Russell Harty: Portanto, vais…?
David Bowie: Acho que provavelmente… Hmm? Vou ser muito mais espontâneo.
Russell Harty: Não planeaste o teu guarda-roupa, não planeaste uma figura, não planeaste uma imagem, o que quer que isso signifique?
David Bowie: Acho que talvez a imagem que eu venha a adotar seja eu, estou a inventar-me neste momento.
Russell Harty: Queres dizer a reinventar-te?
David Bowie: Sim. Autoinventado.
Russell Harty: (risos) Coisas do peito para cima.
David Bowie: Sim. É muito desconfortável.
Russell Harty: Ai, sim? Então, não tens nenhuma ideia simples sobre o que vais vestir, quer dizer, vais usar um casaquinho, um fato apertado, ou vai ser extravagan…
David Bowie: Sei quais as canções que vou cantar, que é o mais importante…
Russell Harty: Vais…
David Bowie: … mas mais nada, não.
Russell Harty: Há temas novos?
David Bowie: Sei o tipo de músicos que vou levar. Não tenho nenhuma ideia aproximada de quanto tempo vou ficar no palco, mas isso é que é importante.
Russell Harty: O que é que te faz voltar? Estás com falta de dinheiro ou sentes a falta de um público ao vivo?
David Bowie: Falta de Inglaterra, acima de tudo.
Russell Harty: Como? Ou seja, tens a noção de que a Inglaterra que deixaste há dois anos não é a Inglaterra para a qual vais voltar?
David Bowie: Sim, esta quinta-feira não tem nada a ver com a quinta-feira passada mas é igualmente importante. Sentir-lhe-ia a falta se não viesse depois de quarta.
Russell Harty: Sabes que a cena pop, o mundo pop teve algumas mudanças desde que partiste?
David Bowie: Não. Não…
Russell Harty: Ouviste falar nos Bay City Rollers?
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Bom, sabes que estão a captar um público jovem que reage com histeria de massas e que se faz notar de muitas maneiras. Pergunto-me que tipo de público vais encontrar no teu regresso…
David Bowie: Não sei. O que achas?
Russell Harty: Não sei. Acho que, de certa forma, vais ter que criar uma nova onda para ti.
David Bowie: Não.
(silêncio prolongado)
Russell Harty: O que…
Davod Bowie: Não tenho capacidade para isso. Limitar-me-ei a voltar e a tocar as minhas canções. (sorri)
Russell Harty: Bom, para alguém que… Parece que disseste, David, que para alguém que não é um músico muito bom, geraste muita confusão, muito ruído.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Se não te consideras um bom músico, o que procuras?
(Bowie faz um brinde)
Russel Harty: Que é que estás a beber ?
David Bowie: Tree Top Beverages! (uma marca de bebidas que inclui, basicamente, sumos de frutas)
Russell Harty: É bom? Vais-nos cuspir um pouco via satélite?
David Bowie: Não.
Russell Harty: Hmm, para alguém que afirma não crescer enquanto músico, porque é que vais voltar e subir aos palcos? Será que, na verdade, és um músico melhor do que aquilo que admites?
David Bowie: Não sou capaz de estabelecer a ligação entre essas duas coisas. Se não sou um músico assim tão bom, porque é que regresso…
Russell Harty: Sim.
David Bowie: Bom, regressar não tem nada a ver com ser um músico.
Russell Harty: Mas achas que és um músico melhor depois destes dois anos de…
David Bowie: Não digo no palco! Sou um bom artista e sou um bom cantor. Isso não tem nada a ver com ser um músico. Tem?
Russell Harty: Bom, não sei, quer dizer, tens que mo dizer, ou seja, uma afirmação tão profunda, não acho que possa…
David Bowie: Não tem que ser tão a preto e branco, ou tem? Vais contribuir com algo?
Russell Harty: Qualquer coisa. Estou a usar um satélite caro.
David Bowie: Ok.
Russell Harty: Então, também disseste que precisavas de espantar as pessoas, não queres regressar como um tipo normal a fazer um espetáculo normal no Odeon Hammersmith. Neste instante, tens alguma ideia, além de que vais simplesmente tocar ao vivo, de como é que nos vais espantar ou a ideia só te surge na noite anterior?
David Bowie: Provavelmente, vou ser mais rápido do que já fui… Essa vai ser a minha… não, não tenho mesmo nenhuma ideia quanto a isso. O impacto do espetáculo é que tem que causar espanto, não a sua aparência, entendes? O visual não passa de um visual, é um tipo de coisa superficial mas o conteúdo tem que ser marcante, ou seja, podes gastar triliões de dólares ou triliões de libras em adereços mas se o espetáculo não tiver substância não vai causar impacto.
Russell Harty: Que te lembres, qual foi a melhor coisa que já fizeste num palco, que ainda está viva em ti quando analisas tudo?
David Bowie: A melhor, é muito difícil. Uma das coisas mais estimulantes que fiz foi trabalhar com o Lindsay, o Lindsay Kemp, em… quando é que terá sido? Não me lembro da data mas foi há anos… Foi um tipo de espetáculo com diferentes media combinados. Foi muito bom.
Russell Harty: Não tinha que ser um enorme estímulo super brilhante, quer dizer, foi uma pequena… só é importante para ti.
David Bowie: Bem, sim.
Russell Harty: Acabaste de filmar a película O Homem que Veio do Espaço (The Man who Came to Earth).
David Bowie: Fell to Earth.
Russell Harty: Fell to Earth, peço desculpa. Não se trata de um filme fácil de explicar a quem o não tenha visto e ainda não está concluído, pois não?
David Bowie: A parte visual está concluída, mas falta o som. Tenho que gravar o som, já escrevemos grande parte… Digo-te… O que te posso dizer é que se trata, sobretudo, de uma história de amor. É muito, muito triste. Muito romântico. Deu-me um nó na garganta quando o vi e tem sido espetacular trabalhar nele. Sim.
Russell Harty: Foi-te fácil assimilares a disciplina das filmagens que é, como bem sabemos, dura?
David Bowie: Oh! Muito fácil. Sou uma pessoa muito disciplinada, sabes. Para mim, foi muito estimulante trabalhar com outras pessoas igualmente disciplinadas.
Russell Harty: Estás a ser mesmo exato e honesto quando afirmas que és disciplinado?
David Bowie: Com certeza.
Russell Harty: Impões-te uma disciplina quando escreves, não acordas só quando… Muita gente na tua posição tem uma espécie de…
David Bowie: Não significa que tenha que tomar o pequeno-almoço às oito da manhã e sair de casa às oito e um quarto. A disciplina é… se pensares em algo, decides se vale a pena avançar e, caso valha a pena, levas as coisas a direito até à sua conclusão lógica e dás o teu melhor. Essa é que é a disciplina. Certo? Mesmo se houver algumas áreas que não te agradem, tens que levar as coisas até ao fim, trabalhá-las e é isso que faço.
Russell Harty: E, mais importante do que isso, podem não agradar aos outros. É frequente haver coisas que, enquanto grande estrela, decides fazer, que deixam as pessoas num estado de antecipação.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Porque podes não ser a pessoa certa na altura certa ou podes estar sem inspiração e necessitas de alguém que ta renove.
David Bowie: É porque gosto bastante de olhar para mim mesmo e de olhar para a atmosfera que me rodeia em cada momento através dos olhos de alguém que não tem qualquer envolvimento com nenhum campo das artes. Daí resulta uma espécie de manifestação eclética. Continuo a ser fã de tudo… Fã de discos, fã de bandas de rock, teu fã…
Russell Harty: Bom, obrig…
David Bowie: Sou teu fã.
Russell Harty: Bom, voltemos às manifestações ecléticas. O filme, agora… Vamos ver um pouco do filme O Homem que Veio do Espaço (The Man Who Fell to Earth) e, depois, falaremos acerca dele. Aqui estás, caíste na Terra e, quando te estás a adaptar à atmosfera, tornas-te o alvo das atenções de uma jovem no teu quarto de hotel.
David Bowie: Ouve, antes de passares isso, tenho que explicar que a assunção de que sou um alienígena do espaço cósmico não é necessariamente verdadeira.
Russell Harty: Muito bem. Ótimo.
Passa um excerto de O Homem que Veio do Espaço.
Russell Harty: David, o filme não está concluído, ainda não está editado e pronto, mas já perpassam áreas de mistério, grande parte dele é misteriosa, isso é deliberado?
David Bowie: Sim, trata-se de um mistério. Como muitas coisas costumam ser.
Russell Harty: Será que dizer que o final não é muito feliz é revelar demasiado?
David Bowie: Realmente é. E não, o final não é feliz. Eu não estou lá para a Candy Clark. Não achas a Candy Clark boa atriz?
Russell Harty: Mesmo boa.
David Bowie: Excelente.
Russell Harty: Ele já tinha trabalhado noutros filmes?
David Bowie: O último em que participou foi o Loucuras de verão (American Graffiti, filme de George Lucas, de 1973).
Russell Harty: Mas até que ponto também contribuíste para o filme? Quero dizer, o Nicholas Roeg parava e dizia: “Para onde vamos? Como é que nos movimentamos? Que é que achas?”. Tiveste um papel ativo na realização?
David Bowie: Não, a minha contribuição foi a minha representação. E a cenografia em geral. Tenho o maior respeito pelo trabalho de Nicholas Roeg. Não. Não teria feito o filme se assim não fosse.
Russell Harty: Ainda pensas nos extraterrestres, ainda tens a perceção de forças, que não satélites, que se movem em torno do globo, deste planeta, em torno de ti, David Bowie?
David Bowie: Claro que sim!
Russell Harty: Que tipo de manifestações complexas recebes disso?
David Bowie: Hmm… Uma montanha ou uma árvore são manifestações de forças com as quais não sabemos lidar.
Russell Harty: Também vais à igreja?
David Bowie: Não.
Russell Harty: Rezas?
David Bowie: Sim, claro.
Russel Harty: Mas rezas às montanhas e às árvores, a essas manifestações físicas, ou a algum tipo de espírito?
David Bowie: Não acho que queira entrar por aí numa entrevista de vinte minutos. Quando voltar a Inglaterra poderei dizer-te o que penso, sim. Em profundidade.
Russell Harty: É sensato. O filme fez nascer em ti a vontade de participares em mais?
David Bowie: Não. Muito dificilmente. O que fez foi fazer crescer em mim a vontade de voltar às pequenas coisas que costumava fazer há muitos anos. Como pintar, escrever, passar tempo livre a sós e com a minha família, afastar-me das cidades…
Russell Harty: E relaxar.
David Bowie: Não, muito mais do que relaxar, sentir-me à vontade.
Russell Harty: Espero contribuir para que te sintas à vontade um ou dois segundos, já que vamos fazer uma pausa para anúncios e regressaremos em um ou dois minutos…
David Bowie: Ok.
Pausa para anúncios
Russell Harty: Uma vez mais, bem vindos. David Bowie, de regresso, sentado numa estranha praia em Burbank, Los Angeles. Falamos sobre filmes e a forma como se constroem. Uma das pessoas com quem imagino que tivesses gostados de trabalhar seria Pier Pasolini…
David Bowie: Teria?
Russell Harty: Li noutras entrevistas tuas que achavas o trabalho dele estimulante.
David Bowie: Neste momento, só consigo pensar em trabalhar com o Nicholas Roeg. Nunca fiz um filme. Não sei se voltarei a fazer um filme. E, para mim, não é uma questão de entrar no mundo do cinema… Este trabalho foi uma coisa tangível e tátil. E uma experiência de que precisava. Não tenho a certeza de gostar da ideia de me tornar ator. Em si.
Russell Harty: Mas estás numa posição privilegiada, não estás, David? Não tens que decidir nada assim, pois não?
David Bowie: Todos os dias tenho que tomar tantas decisões como qualquer outra pessoa. Sim, tenho que tomar decisões. Considero-me bastante responsável.
Russel Harty: Não estava a por em causa o teu sentido de responsabilidade, mas digo que estás mais bem equipado do que a maioria das pessoas para tomares esse tipo de decisões relativamente ao teu futuro…
David Bowie: Não foi nada disso que disseste! (risos)
Russell Harty: Se é…
David Bowie: Ah-ah!
Russell Harty: Não é o que eu disse, mas é o que pretendia dizer.
David Bowie: Sim, sou capaz de decisões determinadas.
Russell Harty: Quero dizer, tens a fama, tens uma certa fortuna, tens atores que te podem dar bons conselhos, pelo que não és como um rapaz ou uma rapariga numa cave em Notting Hill, lutando para conseguir uma posição favorável… Alguém que quer ser ator, estrela do cinema, entrar em cena.
David Bowie: Mas já fui.
Russell Harty: Consegues recordar esses tempos?
David Bowie: Sim, perfeitamente. Faço o mesmo que fazia nesses tempos.
Russell Harty: Mas talvez seja isso que te torna melhor do que serias se assim não fosse. Porque te lembras desse tipo de disciplina e dos tempos difíceis. Mas agora estás numa posição em que podes desfrutar.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Estás a gostar do dia de hoje? Estás a gostar desta conversa?
David Bowie: Acho-a maravilhosa!
Russell Harty: (risos)
David Bowie: A sério que sim. Bastante. Só é pena teres tantas certezas. Porque atualmente tenho muito cuidado ao lançar-me nesse tipo de…
Rissell Harty: Já reparei!
David Bowie: … discuss… apenas porque gosto muito de conversar e parece-me uma perda de tempo disparar à toa. Mas é ótimo! Acho que vamos num ritmo muito razoável.
Russell Harty: Ainda bem. Vou-te dizer do que gosto, embora não devesse: ter esta conversa a uma distância de milhares de quilómetros…
David Bowie: É estranho, não é?
Russell Harty: Muito estranho. Mas não me importo que não me respondas a certas perguntas. Quero dizer, lancei-te cerca de cinco perguntas difíceis e fico satisfeito por não responderes porque tens toda a razão.
David Bowie: É a falta de tempo, a falta de tempo…
Russell Harty: Certo. Sabes, desde que estiveste neste programa, a tua senhora foi minha convidada e gerou alguma turbulência…
David Bowie: Esteve muito bem. Eu vi. Mandaram-me uma cópia. Ela é adorável, é muito boa.
Russell Harty: E fala muito.
David Bowie: Sim.
Russell Harty: E penso… ela já decidiu o que pretende? Ela está cá, está sozinha?
David Bowie: Está na Suíça à procura de uma casa.
Russell Harty: Para os dois?
David Bowie: Sim. Vamos lá ficar enquanto ando em tour pela Europa.
Russell Harty: Se ela vir este programa…
David Bowie: Somos três. Nós os três.
Russell Harty: Zowie, Zowie… (alterando a pronunciação do nome) Como é que se diz?
David Bowie: Sim.
Russell Harty: Está com que idade?
David Bowie: Zowie.
Russell Harty: Está com que idade?
David Bowie: Bom, quatro anos e meio, cinco em maio.
Russell Harty: E vai ao infantário ou onde vai?
David Bowie: Sim. Sim.
Russell Harty: Obrigam-no?
David Bowie: Sim. (sorriso) É muito inteligente.
Russell Harty: Ele sabe…
David Bowie: É uma criança. Quero dizer, é inteligente como qualquer criança deve ser na idade dele. Não é nenhum prodígio, graças a Deus.
Russell Harty: Ainda.
David Bowie: Ainda.
Russell Harty: Dá-lhe tempo, David, dá-lhe tempo… Sabes, desde que partiste, ou melhor, recentemente, os jornais têm andado a aborrecer a tua mãe… Dizem que de vez em quando se sente triste e que sente uma certa angústia e que não contacta muito contigo. É conversa ou é mesmo assim?
David Bowie: Na verdade, isso só me diz respeito a mim.
Russell Harty: E é assim que vai continuar, sim?
David Bowie: Sim. Estou a ver que tens um forte sexto sentido para boatos (sense of rumour em vez de sense of humour), Russell!
Russell Harty: (risos) Um sexto sentido altamente desenvolvido! Bom, David, estamos a aproximar-nos do fim da nossa conversa forçada.
David Bowie: (irónico) Oh, que pena!
Russell Harty: Acho que podemos terminar com um pouco de música. Porque suponho que onde estás, no bonito centro de Burbank, terás alguma música contigo. Quero dizer, não te vais levantar e atuar, mas…
David Bowie: Não! A verdade é que gostaria de o fazer, só que o tempo não o permite, mas vou ver, sei o que é, estou muito bêbedo nessas filmagens! Estava muito nervoso e bebi um par de copos, algo que nunca faço, não deveria tê-lo feito. Está muito bem, é muito divertido.
Russell Harty: Para o programa?
David Bowie: Com certeza!
Russell Harty: Bom, vamos vê-lo. A canção chama-se The Shape of Things to Come…
David Bowie: Isso não é David Bowie.
Russell Harty: Não, não, não, claro que não. Vamos ter uma antevisão de The Shape of Things to Come. A canção chama-se Golden Tears. Mr. David Bowie! Estaremos de volta depois de vermos alguns…
David Bowie: Enganaste-te no nome, é Years.
Russell Harty: Years? Porque é que não a apresentas?
David Bowie: (enquanto Golden Years começa a passar) Este é David Bowie a cantar Golden Years do seu próximo álbum, Station to Station!