2003– Entrevista com Amobé Mévégué para o programa Acoustic, do canal de televisão francês TV5, nos bastidores de um concerto no Palais Omnisport de Bercy, em 20 de outubro
Amobé Mévégué: Olá a todos. Obrigado por assistirem ao Acoustic numa emissão excecional ao encontro de uma das maiores lendas do rock internacional. David Bowie está connosco, estamos com David Bowie. Olá, David.
David Bowie: Olá.
Amobé Mévégué: Gostaria de começar por te perguntar se falas Francês, algumas palavras?
David Bowie: Não, não falo. (risos) Bom, talvez fale, mas só em privado.
Amobé Mévégué: É uma grande honra, um enorme prazer ter-te hoje connosco no programa. Tens andado em tournée mundial e tens oito concertos em França…
David Bowie: Correto.
Amobé Mévégué: Esta é, sem dúvida, uma das tuas maiores tournées desde 1995…
David Bowie: Sim.
Amobé Mévégué: Porquê oito concertos em França? Foi porque sentias falta do público francês?
David Bowie: Sempre fomos muito bem recebidos em França. A nossa música sempre foi bem acolhida. Como esta tournée é muito extensa, achámos… estamos a tocar em mais cidades em cada país e, como a França representa uma grande parte do nosso público, pareceu bem que fizéssemos seis ou sete. Acabámos por nos decidirmos por oito, o que é ótimo, dá-me muito prazer.
Amobé Mévégué: Já trabalhaste com o Tony Visconti em mais de doze álbuns. É porque são amigos ou trata-se de uma das chaves do sucesso?
David Bowie: É verdade que parece que quando trabalhamos em conjunto parece haver algum tipo de química que não encontro com muitos, bom, virtualmente com mais nenhum produtor. Nunca consegui identificar realmente o que é, mas tem algo a ver com uma ausência de julgamento da parte dele, permite-me pensar no que pretendo fazer e nunca me diz “isto é impossível” ou “aquilo é impossível”. Portanto, trata-se de… sinto que ele me dá muita liberdade, o que é bom.
Amobé Mévégué: David Bowie em tournée mundial para apresentar o seu vigésimo-sexto álbum: a Ásia, a América, a Europa, incluindo, claro, algumas datas em França. Estamos em Bercy, recebes-nos. Como é que te sentes minutos antes de entrares no palco?
David Bowie: Sinto que me vou divertir. Não me sinto nervoso. Sinto apenas que me quero divertir. Acho que é esse o sentimento da minha banda também. Não acho que soframos dos nervos. Sabemos que somos bons! (risos) Isso é modéstia ou quê? Sim. Mas sabemos que o nosso espetáculo é bom e que a nossa música é diversificada. Não são só grandes êxitos, percebes? Toco, pelo menos, meia dúzia de temas que toda a gente conhece. Mas grande parte do que tocamos são os nossos temas preferidos. Então, não é o caminho mais fácil, o público tem que se esforçar um pouco. Mas, no fim de tudo, acho, isso torna o espetáculo mais satisfatório. Porque não se trata de fast food. (risos)
(passa The Jean Genie ao vivo, com Bowie na harmónica)
Amobé Mévégué: David Bowie no Acoustic em Bercy, durante uma tournée mundial que acompanha o seu vigésimo-sexto álbum, Reality, é o nome do álbum. Ouvimo-lo e percebemos diversas influências… Ouvimos as faixas e escutamos influências do jazz, do pop, do rock, claro, do flamenco. Trata-se de uma espécie de resumo das tuas influências musicais?
David Bowie: Acho que agora me é difícil saber exatamente mesmo… É ainda mais difícil, à medida que envelheço, saber exatamente qual é o meu estilo porque ao longo dos anos trabalhei diferentes áreas. Portanto, agora não me coloco essa questão até ao momento em que finalizo um álbum, olho para trás e começo a analisá-lo e a perceber quantos estilos utilizo. Mas, na altura, não me ocorre que sejam estilos diferentes que… São apenas canções, peças musicais que criamos no estúdio, percebes?
Amobé Mévégué: És um dos artistas mais famosos do mundo. Como é que é possível seres assim famoso e manteres uma ligação com as pessoas normais?
David Bowie: (risos) As pessoas normais!...
Amobé Mévégué: Só te pergunto isto porque…
David Bowie: O proletariado!
Amobé Mévégué: … Ashes to Ashes é a minha canção preferida, é por isso que pergunto…
David Bowie: Vamos tocá-la hoje. (risos)
Amobé Mévégué: Muito obrigado. Fico contente. Então, é possível ser assim tão famoso e…
David Bowie: É, hmm… Acho que se trata de decidir um estilo de vida mas, sabes, pessoalmente não preciso disso, nem eu nem a minha mulher temos nenhum desejo especial de viver à maneira de Hollywood. Nós não… Vivemos em Nova Iorque, que é uma cidade muito terra-a-terra. É difícil ser-se “glamoroso” em Nova Iorque dessa maneira. Especialmente onde vivemos, no centro. Que é uma zona, acho, acima de tudo boémia. Nenhum de nós gostaria de ter um tipo de existência à maneira de Hollywood. Então, não vamos muito por aí. Vivemos uma vida muito normal. Quando não estou a trabalhar, sou muito low profile. Não vou muito a, sabes, sítios onde me fotografem. Portanto, acho que tentamos manter os pés assentes na terra e não… Não temos a ambição de sermos “hollywoodescos”. (risos) Faz sentido?
(passa a versão ao vivo de New Killer Star)
Amobé Mévégué: Acoustic nos bastidores de um concerto central de uma vasta tournée que acompanha o lançamento do vigésimo-sexto álbum de David Bowie. És uma espécie de ícone, um modelo a seguir, como algumas pessoas dizem…
David Bowie: No McDonald’s! (risos) (menção a Ronald McDonald)
Amobé Mévégué: Sim. Então, impressiona-te…
David Bowie: Não! (risos)
Amobé Mévégué: Sentes alguma coisa especial? Como é que te sentes relativamente a isso? A poderes influenciar outras pessoas?
David Bowie: Ah! Ok, isso é diferente. Musicalmente, é sempre muito compensador quando me parece ouvir elementos de coisas que fiz no passado na música de outros. Fico muito contente porque me faz sentir que tive algo de válido para dizer e que isso alterou o vocabulário da arte que escolhi como carreira, como vida. Portanto, esse tipo de influência é muito compensador, acho, para um escritor, para um compositor, seja o que for. Mas o lado icónico… Passava sem ele. (risos) Não preciso disso.
Amobé Mévégué: Arrancaste em setembro, em Londres, com um concerto para 400 felizardos que convidaste. O evento foi difundido por computador para 22 países. Como é que te surgiu essa ideia?
David Bowie: Muito honestamente, a verdade é que a ideia foi da Sony, a companhia que edita os meus discos. Eles queriam muito fazer algo assim e eu senti vontade de não recusar a ideia, de a aceitar como algo de realmente estimulante. E fiquei contente por o termos feito. Obviamente, terá que haver muitos mais cinemas tecnicamente apetrechados para receber esse tipo de imagens instantaneamente. Obviamente, acho que as despesas associadas à implementação disso terão que descer mesmo muito antes de isso se tornar uma possibilidade. Mas também considero que, em não muitos anos, tratar-se-á de uma forma interessante de alguns artistas poderem andar em tournée. Reduzem a tournée e fazem dez espetáculos por cada espetáculo, percebes? Provavelmente, seria possível chegar a um número muito maior de lugares. Cidades pequenas, sem capacidade para acolher os U2, porque são apenas alguns milhares de pessoas. Mas o espetáculo poderia ser visto ao vivo no cinema local. Faz sentido. É uma ideia com interesse. Parece-me fazer parte do futuro, sim, acho que sim.
(passa a versão ao vivo de Fame)
Amobé Mévégué: Falávamos da tua ligação a África. O que sabes sobre essa parte do mundo? Conheces a música, os músicos?
David Bowie: Sei alguma coisa. Mas não acho que tenha sido muito importante na minha música. Tenho um grande amigo na América, o David Byrne, que trabalha com uma banda chamada Talking Heads… Foi muito influenciado, penso, pela música da África Ocidental, sobretudo. O King Ade, acho. Sunny. Mas, no que me toca, conheço razoavelmente o continente. Sobretudo nos anos setenta e oitenta, costumava visitar a África Oriental. A Tanzânia e o Quénia e tinha sentimentos muito fortes pelo continente, gostava muito. E então, da primeira vez que visitei a África do Sul – por motivos óbvios, mantive-me afastado da África do Sul por muitos anos… Mas nessa altura, em 1992, logo a seguir a Nelson Mandela ter sido eleito, eu e a minha mulher fomos lá e tivemos e felicidade de o conhecer, de passar tempo com ele… E passámos algum tempo na África do Sul, de que gostámos muito.
Amobé Mévégué: Bom, toda a gente conhece…
David Bowie: Fui ver o… desculpa.
Amobé Mévégué: Não, continua.
David Bowie: Não, não. (risos)
Amobé Mévégué: É a minha última pergunta: toda a gente conhece esta canção do Sting, Englishman in New York. De certeza que ele fez a canção para ele mesmo ou terá sido para ti?
David Bowie: Oh, sem dúvida que acho que foi para ele mesmo. (risos)
Amobé Mévégué: Obrigado por teres participado no programa.
David Bowie: O prazer foi meu.
Amobé Mévégué: A TV5 deseja-te muitas felicidades.
David Bowie: Obrigado.
Amobé Mévégué: Boa sorte para a tournée por parte da TV5.
David Bowie: Merci beaucoup.
(termina com a versão ao vivo de Cactus)
David Bowie: Olá.
Amobé Mévégué: Gostaria de começar por te perguntar se falas Francês, algumas palavras?
David Bowie: Não, não falo. (risos) Bom, talvez fale, mas só em privado.
Amobé Mévégué: É uma grande honra, um enorme prazer ter-te hoje connosco no programa. Tens andado em tournée mundial e tens oito concertos em França…
David Bowie: Correto.
Amobé Mévégué: Esta é, sem dúvida, uma das tuas maiores tournées desde 1995…
David Bowie: Sim.
Amobé Mévégué: Porquê oito concertos em França? Foi porque sentias falta do público francês?
David Bowie: Sempre fomos muito bem recebidos em França. A nossa música sempre foi bem acolhida. Como esta tournée é muito extensa, achámos… estamos a tocar em mais cidades em cada país e, como a França representa uma grande parte do nosso público, pareceu bem que fizéssemos seis ou sete. Acabámos por nos decidirmos por oito, o que é ótimo, dá-me muito prazer.
Amobé Mévégué: Já trabalhaste com o Tony Visconti em mais de doze álbuns. É porque são amigos ou trata-se de uma das chaves do sucesso?
David Bowie: É verdade que parece que quando trabalhamos em conjunto parece haver algum tipo de química que não encontro com muitos, bom, virtualmente com mais nenhum produtor. Nunca consegui identificar realmente o que é, mas tem algo a ver com uma ausência de julgamento da parte dele, permite-me pensar no que pretendo fazer e nunca me diz “isto é impossível” ou “aquilo é impossível”. Portanto, trata-se de… sinto que ele me dá muita liberdade, o que é bom.
Amobé Mévégué: David Bowie em tournée mundial para apresentar o seu vigésimo-sexto álbum: a Ásia, a América, a Europa, incluindo, claro, algumas datas em França. Estamos em Bercy, recebes-nos. Como é que te sentes minutos antes de entrares no palco?
David Bowie: Sinto que me vou divertir. Não me sinto nervoso. Sinto apenas que me quero divertir. Acho que é esse o sentimento da minha banda também. Não acho que soframos dos nervos. Sabemos que somos bons! (risos) Isso é modéstia ou quê? Sim. Mas sabemos que o nosso espetáculo é bom e que a nossa música é diversificada. Não são só grandes êxitos, percebes? Toco, pelo menos, meia dúzia de temas que toda a gente conhece. Mas grande parte do que tocamos são os nossos temas preferidos. Então, não é o caminho mais fácil, o público tem que se esforçar um pouco. Mas, no fim de tudo, acho, isso torna o espetáculo mais satisfatório. Porque não se trata de fast food. (risos)
(passa The Jean Genie ao vivo, com Bowie na harmónica)
Amobé Mévégué: David Bowie no Acoustic em Bercy, durante uma tournée mundial que acompanha o seu vigésimo-sexto álbum, Reality, é o nome do álbum. Ouvimo-lo e percebemos diversas influências… Ouvimos as faixas e escutamos influências do jazz, do pop, do rock, claro, do flamenco. Trata-se de uma espécie de resumo das tuas influências musicais?
David Bowie: Acho que agora me é difícil saber exatamente mesmo… É ainda mais difícil, à medida que envelheço, saber exatamente qual é o meu estilo porque ao longo dos anos trabalhei diferentes áreas. Portanto, agora não me coloco essa questão até ao momento em que finalizo um álbum, olho para trás e começo a analisá-lo e a perceber quantos estilos utilizo. Mas, na altura, não me ocorre que sejam estilos diferentes que… São apenas canções, peças musicais que criamos no estúdio, percebes?
Amobé Mévégué: És um dos artistas mais famosos do mundo. Como é que é possível seres assim famoso e manteres uma ligação com as pessoas normais?
David Bowie: (risos) As pessoas normais!...
Amobé Mévégué: Só te pergunto isto porque…
David Bowie: O proletariado!
Amobé Mévégué: … Ashes to Ashes é a minha canção preferida, é por isso que pergunto…
David Bowie: Vamos tocá-la hoje. (risos)
Amobé Mévégué: Muito obrigado. Fico contente. Então, é possível ser assim tão famoso e…
David Bowie: É, hmm… Acho que se trata de decidir um estilo de vida mas, sabes, pessoalmente não preciso disso, nem eu nem a minha mulher temos nenhum desejo especial de viver à maneira de Hollywood. Nós não… Vivemos em Nova Iorque, que é uma cidade muito terra-a-terra. É difícil ser-se “glamoroso” em Nova Iorque dessa maneira. Especialmente onde vivemos, no centro. Que é uma zona, acho, acima de tudo boémia. Nenhum de nós gostaria de ter um tipo de existência à maneira de Hollywood. Então, não vamos muito por aí. Vivemos uma vida muito normal. Quando não estou a trabalhar, sou muito low profile. Não vou muito a, sabes, sítios onde me fotografem. Portanto, acho que tentamos manter os pés assentes na terra e não… Não temos a ambição de sermos “hollywoodescos”. (risos) Faz sentido?
(passa a versão ao vivo de New Killer Star)
Amobé Mévégué: Acoustic nos bastidores de um concerto central de uma vasta tournée que acompanha o lançamento do vigésimo-sexto álbum de David Bowie. És uma espécie de ícone, um modelo a seguir, como algumas pessoas dizem…
David Bowie: No McDonald’s! (risos) (menção a Ronald McDonald)
Amobé Mévégué: Sim. Então, impressiona-te…
David Bowie: Não! (risos)
Amobé Mévégué: Sentes alguma coisa especial? Como é que te sentes relativamente a isso? A poderes influenciar outras pessoas?
David Bowie: Ah! Ok, isso é diferente. Musicalmente, é sempre muito compensador quando me parece ouvir elementos de coisas que fiz no passado na música de outros. Fico muito contente porque me faz sentir que tive algo de válido para dizer e que isso alterou o vocabulário da arte que escolhi como carreira, como vida. Portanto, esse tipo de influência é muito compensador, acho, para um escritor, para um compositor, seja o que for. Mas o lado icónico… Passava sem ele. (risos) Não preciso disso.
Amobé Mévégué: Arrancaste em setembro, em Londres, com um concerto para 400 felizardos que convidaste. O evento foi difundido por computador para 22 países. Como é que te surgiu essa ideia?
David Bowie: Muito honestamente, a verdade é que a ideia foi da Sony, a companhia que edita os meus discos. Eles queriam muito fazer algo assim e eu senti vontade de não recusar a ideia, de a aceitar como algo de realmente estimulante. E fiquei contente por o termos feito. Obviamente, terá que haver muitos mais cinemas tecnicamente apetrechados para receber esse tipo de imagens instantaneamente. Obviamente, acho que as despesas associadas à implementação disso terão que descer mesmo muito antes de isso se tornar uma possibilidade. Mas também considero que, em não muitos anos, tratar-se-á de uma forma interessante de alguns artistas poderem andar em tournée. Reduzem a tournée e fazem dez espetáculos por cada espetáculo, percebes? Provavelmente, seria possível chegar a um número muito maior de lugares. Cidades pequenas, sem capacidade para acolher os U2, porque são apenas alguns milhares de pessoas. Mas o espetáculo poderia ser visto ao vivo no cinema local. Faz sentido. É uma ideia com interesse. Parece-me fazer parte do futuro, sim, acho que sim.
(passa a versão ao vivo de Fame)
Amobé Mévégué: Falávamos da tua ligação a África. O que sabes sobre essa parte do mundo? Conheces a música, os músicos?
David Bowie: Sei alguma coisa. Mas não acho que tenha sido muito importante na minha música. Tenho um grande amigo na América, o David Byrne, que trabalha com uma banda chamada Talking Heads… Foi muito influenciado, penso, pela música da África Ocidental, sobretudo. O King Ade, acho. Sunny. Mas, no que me toca, conheço razoavelmente o continente. Sobretudo nos anos setenta e oitenta, costumava visitar a África Oriental. A Tanzânia e o Quénia e tinha sentimentos muito fortes pelo continente, gostava muito. E então, da primeira vez que visitei a África do Sul – por motivos óbvios, mantive-me afastado da África do Sul por muitos anos… Mas nessa altura, em 1992, logo a seguir a Nelson Mandela ter sido eleito, eu e a minha mulher fomos lá e tivemos e felicidade de o conhecer, de passar tempo com ele… E passámos algum tempo na África do Sul, de que gostámos muito.
Amobé Mévégué: Bom, toda a gente conhece…
David Bowie: Fui ver o… desculpa.
Amobé Mévégué: Não, continua.
David Bowie: Não, não. (risos)
Amobé Mévégué: É a minha última pergunta: toda a gente conhece esta canção do Sting, Englishman in New York. De certeza que ele fez a canção para ele mesmo ou terá sido para ti?
David Bowie: Oh, sem dúvida que acho que foi para ele mesmo. (risos)
Amobé Mévégué: Obrigado por teres participado no programa.
David Bowie: O prazer foi meu.
Amobé Mévégué: A TV5 deseja-te muitas felicidades.
David Bowie: Obrigado.
Amobé Mévégué: Boa sorte para a tournée por parte da TV5.
David Bowie: Merci beaucoup.
(termina com a versão ao vivo de Cactus)